Documentário A Bolsa ou a Vida - Sílvio Tender (2021)
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O filme “A Bolsa ou a Vida”, lançado em 2021, retrata a desigualdade social no Brasil e contesta o sistema financeiro.

O vídeo do documentário completo está disponível, gratuitamente, no canal Caliban do YouTube – clique aqui.

Temática abordada

O filme é o manifesto de intelectuais contra a excessiva concentração de riquezas no Brasil e a exclusão da população mais pobre.

Um dos entrevistados, o economista Eduardo Moreira, diagnostica que os pobres não conseguem melhorar de vida no Brasil, pois lhes faltam os capitais financeiro, tecnológico (máquinas) e intelectual (conhecimento).

Os pobres são obrigados a morar em habitações precárias na periferia das grandes cidades brasileiras. Nesses locais faltam infraestruturas e serviços públicos. Consequentemente, a população fica sem assistência adequada e sujeita às milícias organizadas.

Além do déficit de moradias e infraestrutura, a população trabalhadora enfrenta dificuldades de mobilidade urbana. Utiliza  transporte público caro e desconfortável para deslocamento até o trabalho em regiões distantes nas cidades.

Diversas questões ambientais demandam maior atenção por parte dos governos. O país tem vastos recursos ambientais, mas sua exploração desequilibrada compromete a sustentabilidade, especialmente na Amazônia. O desmatamento das florestas objetiva a implantação de monoculturas, pecuária e o extrativismo mineral, contribuindo para aumentar os efeitos das mudanças climáticas.

Os entrevistados apontam que o sistema financeiro tem contribuído para aumentar a desigualdade e a exclusão social, mediante o esfacelamento das políticas públicas do Estado e privatizações. A cultura tem sido desprezada.

Bancos cobram taxas de juros elevadas que geram maior endividamento ou são inacessíveis aos mais pobres e aos micro e pequenos empreendedores.

O dinheiro captado pelos bancos é reinvestido no sistema financeiro. Grandes corporações sem atuação sustentável recebem aportes e captam recursos na Bolsa de Valores, mantendo o ciclo vicioso.

Após a pandemia Covid-19, a desigualdade social aumentou em função da perda de empregos e dificuldade para retomada das atividades econômicas.

Ficha Técnica

  • Título: A Bolsa ou a Vida
  • Categoria: Documentário  filme-manifesto com entrevistas
  • Direção: Silvio Tendler
  • Duração: 102 min (1 h 42 min)
  • Ano de lançamento: 2021
  • País: Brasil

Resenha Crítica do GEDAF

O filme tem o mérito de mostrar a grande desigualdade social no Brasil, agravada pela pandemia, estimular reflexões sobre a economia e a exploração insustentável da natureza.

Contudo, falha em aprofundar a análise das deficiências estruturais do país. O roteiro é superficial e tem viés ideológico.

Houve participação de defensores do socialismo que se contrapõem ao capitalismo financeiro devido às mazelas do Brasil. O excesso de dramatização é risível na caricatura grotesca do drácula com sangue nos dentes sob a forma de barras vermelhas no gráfico do pregão da bolsa.

As letras das músicas e poemas merecem destaque. Passam mensagens para aliviar frustrações existenciais na luta contra o sistema financeiro opressor.

Vários entrevistados no documentário são apoiadores ou foram integrantes de governos petistas. Apresentam-se cenas de manifestação em 2020 apoiada pelo movimento sindical na Avenida Paulista, em São Paulo, pessoas com faixas “Fora Bolsonaro”. Fica comprovado o viés ideológico nessa produção.

Faltou analisar a baixa qualidade da educação brasileira, entre as piores do mundo, a ausência de políticas públicas para desenvolvimento urbano. Foram ignorados o fisiologismo e as inúmeras legendas de aluguel, a corrupção bilionária revelada pela Lava Jato, e a subserviência do Estado aos interesses de certos grupos e castas.

O Brasil não tem projeto concreto de nação desenvolvida e próspera. Persiste forte dependência da exportação de commodities agrícolas e minerais. O parque industrial e o capital intelectual foram gradualmente desmobilizados e desestimulados nas últimas décadas.

Os autores revelam desconhecimento sobre a Bolsa de Valores. O mercado de capitais auxilia as empresas que necessitam de capital mais barato para se expandir. Oferece proteção contratual (hedge) e preservação do patrimônio dos fundos de pensão de aposentados.

Os fundos de pensão estão entre os maiores investidores na Bolsa de Valores em vários países. Petrobrás, Eletrobrás, Banco do Brasil e outras estatais possuem ações negociadas na Bolsa de Valores, demonstrando a importância desse mercado.

Na realidade, a Bolsa de Valores socializa a participação no capital e distribuição do lucro das empresas. Qualquer pessoa pode comprar ações, tornando-se sócia de empresas sólidas, investimento acessível. Cerca de 65% dos norte-americanos (200 milhões de pessoas) investe em ações de grandes empresas como Apple, Microsoft, Tesla e outras.

É compreensível o receio do brasileiro sobre o mercado de capitais, pois desconhece suas vantagens. A grande maioria ainda prefere depositar dinheiro na poupança ou outras opções de renda fixa oferecidas pelos bancos, recebendo parcos rendimentos. Menos de 3 milhões de brasileiros operam na Bolsa de Valores.

Nos últimos 40 anos, desde a redemocratização em 1982, o Brasil ainda não conseguiu conciliar desenvolvimento e inclusão social. Mas os culpados não são a Bolsa de Valores ou o capitalismo. Basta verificar os avanços econômicos e sociais dos países desenvolvidos na Europa, Ásia e América do Norte.

Países desenvolvidos são capitalistas e possuem políticas sociais inclusivas (welfare state). A China é exemplo de economia capitalista sofisticada, a despeito de ser governada por comunistas. Esses países investem na educação, incentivam empresas por meio do crédito e mercado de capitais consolidado.

Logo, o problema não é o capitalismo, mas a péssima gestão pública no Brasil. Lamentavelmente, o documentário desviou o foco das causas dos problemas estruturais.

O documentário constata que não existe capitalismo verdadeiro no Brasil, pois os mais ricos e grupos privilegiados estão sempre buscando pagar menos impostos ou obter mais subsídios junto aos diferentes governos. De fato, o país nunca foi capitalista quanto aos fundamentos da livre concorrência.

O Estado brasileiro intervém pesadamente na economia com regulação e fiscalização, excesso de estatais e monopólios, impõe elevada carga tributária. Dessa forma, o governo não cria riquezas, mas gasta muito mal. Desperdiça bilhões em obras com pouca serventia à população, tais como estádios de futebol e complexos olímpicos, e subsídios ou isenções a setores privilegiados.

Brasileiros precisam trabalhar cada vez mais meses no ano para pagar impostos ao governo – eram 5 meses em 2021. Contudo, a população não recebe o retorno sob a forma de serviços públicos com qualidade. Quem pode pagar opta por serviços privados de educação e saúde.

E, assim, sobra pequena parte da renda familiar para consumo, achatando a receita das empresas, dificultando a geração de empregos e novos investimentos. Sem crescimento da renda per capita, não há expansão da economia e redução das desigualdades. Essa é a armadilha da renda média na qual o Brasil está preso.

Apesar das contradições do filme analisado, concordamos que o Brasil precisa se libertar da letargia e reverter a exclusão social. É urgente iniciar amplas reformas econômicas e sociais para assegurar a educação de qualidade, a inovação e o empreendedorismo.

Todavia, a solução não é combater ou extinguir a Bolsa de Valores, mas corrigir as distorções seculares com políticas públicas eficazes e bons projetos de desenvolvimento. O dilema “Bolsa ou a Vida” é falso e maniqueísta, pois os culpados são outros, inclusive os eleitores que escolhem mal seus governantes.

É essencial eleger governantes sérios, responsáveis, comprometidos com a pátria e seus valores. Devemos evitar políticos populistas que se declaram defensores de pobres, mas apenas para mantê-los cativos como eternos eleitores em troca de bolsas-migalhas.

Avaliação do documentário “A Vida ou a Bolsa”

  • Temática: 4, aderente à sustentabilidade, com algumas restrições.
  • Narrativa: 3, diversas distorções utópicas e desconhecimento do sistema financeiro.
  • Fotografia: 4, destaque para imagens do meio ambiente e poesias.
  • Entrevistas: 3, opiniões enviesadas sem contraponto de analistas de mercado.
  • Nota Geral: 3,5

Em síntese, o documentário é recomendado por questionar o fracasso econômico e a desigualdade social no Brasil. Porém, é superficial e tem claro viés ideológico, com distorções utópicas.

Escala: 1 – Péssimo ; 2 – Ruim; 3 – Regular; 4 – Bom; 5 – Excelente

Autor: Rone Antônio de Azevedo, comentarista e especialista em Gestão de Finanças, GEDAF Finanças.

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